Nome dado a um baile funk realizado no Conjunto Habitacional Cingapura, o ‘’12 do Cinga’’ homenageia o time de futebol com sede na região de mesmo nome, fundado em 12 de dezembro de 2004. O Cingapura está localizado à direita da avenida Tenente Amaro Felicíssimo da Silveira, sentido Morvan Dias de Figueiredo, com limites à altura do número 157 e nas ruas Estabela e Lidice.
Apesar de estar situado na parte baixa do Parque Novo Mundo, a localidade possui personalidade independente no sentido de ser muito conhecida, principalmente entre os jovens fãs de funk, já que na região acontece a festa de rua chamada “Baile do Cinga”, responsável por reunir um grande público de diversas regiões, inclusive de outras cidades, mudando completamente o cenário da região.
A fama do 12 do Cinga é tamanha entre o público do funk que em uma rápida busca na web, com as palavras-chave que remetem à comunidade, são encontradas páginas no Facebook como a “Cinga do Mal”, com mais de 201 mil curtidas e mais de 209 mil seguidores, e ao menos 18 vídeos no Youtube, entre músicas e playlists, videoclipes e repercussão das festas, que somam milhões de visualizações. Fato também visto como uma oportunidade de mercado para as empresas de funk.
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Vista do 12 do Cinga pela principal via da região; foto: Renan Salles |
Durante o dia, o Cingapura é um local simples e com movimentação quase que inteiramente de moradores. Com traços característicos de uma comunidade adquiridos ao longo do tempo após sua fundação, o local carente dispõe de pequenos comércios, várias casas em pouco espaço de ruas e vielas de acessos identificadas por blocos e números, tornando o lugar isolado do restante do bairro.
Baile do Cinga
Realizado geralmente nas noites dos fins de semana nas ruas da pequena comunidade, o Baile do Cinga costuma reunir uma verdadeira multidão em datas especiais como o natal e a virada de ano. Desde o início do ano passado, porém, a festa não tem sido realizada por proibição da polícia, segundo relatos, por proibição da polícia.
A gratuidade do acesso, por se tratar de um espaço público, o som alto, as bebidas e o grande público são alguns dos motivos da escolha desse passeio por parte dos jovens.
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Noite de baile funk no 12 do Cinga; foto: Página Cinga do Mal |
Além da alegria do público que comparece ao Cinga, também são realidades do acontecimento o uso de drogas e o transtorno causado aos moradores da região com o impacto do volume alto dos diversos carros de sons que estacionam nos pequenos espaços, além da sujeira e odor gerados pelos frequentadores que fazem as necessidade fisiológicas em locais indevidos.
Guilherme Kauã, morador do Cingapura e frequentador do baile, garante, no entanto, que a intenção de quem vai à festa é que decide os rumos dela. ‘’Se você for só para curtir é de boa. Tem quem exagera, bebe muito a acaba arrumando confusão, mas isso tem em todo lugar’’. Ele conta ainda que os moradores já acostumados, não se incomodam mais com os transtornos causados pelas festas.
Os bailes também causam incômodo aos trabalhadores locais. Enquanto os funcionários de empresas distantes algumas vezes são atrapalhados pela falta de transporte coletivo, uma vez que há motoristas receosos quanto a parar nos pontos por causa da aglomeração de pessoas, comerciantes da região sofrem muitas vezes por não conseguirem abrir seus estabelecimentos da forma que gostariam, seja pela precaução de evitar jovens em alterados ou pela falta de clientela – em casa até mais tarde, também por precaução.
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Festas costumam se estender até o amanhecer; foto: Página Cinga do Mal |
Para Letícia, comerciante na região há sete anos, ‘’se acabasse (os bailes) seria melhor’’, já que os eventos geram certo caos e amedrontam alguns donos de estabelecimentos locais. Letícia conta que já trabalhou durante esses eventos, mas não o faz mais, devido à bagunça. Davina, que trabalha com Letícia complementa: ‘’Tem muita droga, prostituição e coisas erradas (durante as festas)’’.
Porém, Davina e Letícia concordam que uma intervenção de órgãos competentes para organização das festas como opção de lazer para os jovens, seria uma boa saída para toda a população, inclusive os comerciantes, que teriam chances para impulsionar suas vendas.
A polícia realiza ações com frequência em dias de festas, em algumas oportunidades forçando o encerramento dos bailes e, em outras, apenas deslocando os festeiros para lugares mais afastados e menores.
Outro dono de comércio no Cingapura, Cirlânio Santos, o Mineiro, proprietário de um restaurante há um ano e meio, tem uma posição parecida com as entrevistadas anteriores, contra a realização dos bailes, também pelas ações truculentas da polícia. Para ele, ‘’o problema é quando a polícia chega, ela não quer saber quem é trabalhador, inocente e quem não é, joga gás de pimenta em todo mundo e não está nem aí’’’.
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Local tranquilo durante as noites de semana se agitam nos fins de semanas de bailes; foto: Gervasio Henrique |
Cirlânio, mora no Cingapura há 23 anos e apesar de não ser favorável aos bailes, também diz não concordar com as atitudes da polícia para acabar com as festas. Ele relata ainda um episódio dramático que poderia ter resultado em uma tragédia, quando a janela de seu comércio foi atingida por um tiro de um policial, que revidou ao se deparar com jovens arremessando objetos na polícia. O episódio foi motivo de trauma para Cirlânio, que trabalhou apenas uma vez durante o baile.
‘’Embaixo eu pedi calma para o policial e tinha um menino lá em cima (no comércio), por pouco não acerta ele (o tiro). A bala passou pela janela, bateu na parede e parou dentro da geladeira’. É muita covardia fazer isso com um ser humano inocente'', diz ele.
No entanto, há também quem lucre com os bailes: comerciantes que aceitam trabalhar entre a multidão vendendo, principalmente, bebidas, próximos aos paredões, estruturas de sons potentes montadas sobre carros.
Opinião do repórter:
O crescimento dos bailes funks de rua reflete a grave crise econômica vivida nos últimos anos que adicionou elementos ainda mais cruéis a um dos países mais desiguais do mundo. Essa desigualdade tem como efeito direto a limitação cada vez maior de opções de cultura e lazer para as parcelas mais pobres da sociedade, que por questão de acessibilidade escolhem cada vez mais opções populares. Aparelhos de lazer acessíveis para as localidades carentes, somado a um planejamento por parte dos órgãos competentes são os caminhos para mudar esse cenário de forma humanitariamente respeitosa.
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